sábado, 12 de junho de 2010

PRIVATIZAÇÃO: SAQUE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO

Privatização das Aerolíneas Argentinas é exemplo de saque ao patrimônio público

Quando foi privatizada por Carlos Menem, em 1991, a Aerolíneas Argentinas era uma empresa lucrativa e considerada uma das mais seguras do mundo. Vendida para a espanhola Ibéria, a empresa passou por um processo de desmonte e decadência, com venda de aviões, fechamento de oficinas e escritórios e demissão de funcionários. Agora, governo argentino decidiu retomar o controle da empresa.

Marco Aurélio Weissheimer

BUENOS AIRES - A mais recente crise nos aeroportos argentinos causada pela situação de penúria da Aerolíneas Argentinas e pela decisão criminosa de seus proprietários privados (logo após o anúncio da reestatização da empresa pelo governo) de vender passagens acima da capacidade dos aviões disponíveis é um retrato do fracasso do modelo de privatizações implementado pelo governo de Carlos Menem. Criada em 1950 pelo governo de Perón, a empresa chegou a ser líder das companhias aéreas do hemisfério Sul. Quando foi privatizada, a Aerolíneas Argentinas era uma empresa lucrativa e considerada uma das mais seguras do mundo.

Possuía uma frota de 28 aviões próprios e um alugado, com rotas internacionais e escritórios em algumas das mais importantes cidades do mundo. No início dos anos 1990, foi avaliada em cerca de US$ 600 milhões, muito abaixo do seu valor real. No leilão de privatização, a única empresa interessada foi à espanhola Ibéria, que ofereceu US$ 260 milhões em dinheiro por 85% das ações da empresa, mais outros US$ 560 milhões em títulos da dívida argentina. De lá para cá, privatizada, a empresa conheceu um processo de desmonte e decadência.

No dia 17 de julho, o governo argentino anunciou que o grupo espanhol Marsans, sócio-majoritário da Aerolíneas Argentinas e da Austral, teria 60 dias para transferir suas ações ao Estado. Mesmo atravessando uma forte crise, a Aerolíneas ainda é a principal empresa aérea do país, controlando 80% dos vôos domésticos e 40% dos internacionais. Até então, o grupo espanhol tinha 85% das ações, com outros 10% nas mãos dos funcionários e 5% com o governo argentino. A empresa foi privatizada em 1991, durante o governo Carlos Menem (1989-1999), passando a ser controlada pela empresa espanhola Ibéria, que acabou vendendo boa parte dos ativos das Aerolíneas para resolver seus próprios problemas financeiros. Em 1994, a Ibéria entrou em concordata, deixando a Aerolíneas com uma dívida de quase US$ 1 bilhão.

O governo espanhol, que assumiu os ativos da Ibéria na época, decidiu sanear as dívidas da filial argentina e passou as ações para o grupo Marsans, que assumiu o controle da empresa pelo preço simbólico de 1 euro. O grupo espanhol implantou uma política de forte redução de custos na empresa, entrando em rota de colisão com os sindicatos de funcionários da Aerolíneas e enfrentando uma série de greves e problemas nos aeroportos. Agora, o Estado argentino prepara-se para retomar o controle da empresa.

Quando foi privatizada, a empresa dava lucro aos cofres públicos. Motivo de orgulho para os argentinos, a Aerolíneas foi uma das primeiras empresas a ser privatizada na era Menem. Também foram privatizadas empresas estatais dos setores de ferrovias, petróleo e gás, de água e esgoto, Correios, de eletricidade e de telefonia, entre outras. Na maioria desses casos, o patrimônio público argentino foi saqueado e os serviços prestados à população pioraram de qualidade e aumentaram de preço.

Abusos jurídicos e econômicos
Em um artigo publicado no jornal “
Crítica de La Argentina”, o cineasta e ex-candidato à presidência da República, Fernando Pino Solanas, descreve assim alguns dos problemas que marcaram a privatização da empresa aérea nacional:

“A privatização da Aerolíneas foi consumada com abusos jurídicos e econômicos inaceitáveis. Para comprá-la, a Ibéria hipotecou a frota de aviões de nossa companhia. As oficinas da empresa, que contavam com três simuladores de vôo, foram esvaziadas e transferidas para Madri; rotas nacionais internacionais foram extintas; aviões e oficinas em Paris, Nova York e outras capitais foram vendidos. Para evitar a quebra, em 2001, o governo espanhol autorizou um crédito de 800 milhões de euros para o grupo Marsans destinado a pagar as dívidas da Aerolíneas. A empresa pagou apenas uma parte da dívida e o restante do dinheiro foi desviado para outros fins. Como sua irmã venezuelana Viasa – também comprada pela Ibéria – a Aerolíneas também terminou esvaziada e quebrada”.

Qual o balanço das privatizações?
A Argentina foi o país da América Latina que levou adiante, com maior radicalidade, o processo de privatizações. Implementadas com o objetivo declarado de equilibrar as contas públicas, as privatizações acabaram transferindo grande parcela da iniciativa dos investimentos em estruturas de uso público para o setor privado.

Resultado: os valores aplicados pelo setor privado reduziram sensivelmente após as privatizações. Entre 1961 e 1980, a relação investimento/PIB era superior a 20%. Na década de 90, a década das privatizações, esse índice caiu para a faixa entre 10% e 12%. O total arrecadado com as privatizações durante os dois mandatos de Menem somou US$ 40 bilhões, que foram devidamente pulverizados com a política de juros altos.

No período Menem, a concentração de renda aumentou brutalmente na Argentina. Em 1974, os 20% mais pobres detinham 6,7% da renda nacional. Em agosto de 1998, esse índice era de apenas 4,2%. Em contrapartida, a renda dos 20% mais ricos cresceu de 43,7% para 53,2% no mesmo período. Ainda em 1998, o índice de concentração de renda argentina ficou acima da média latino-americana, chegando a 52,9%. As condições para a grave crise econômica, política e social que viria a seguir estavam dadas.

Somente na província de Buenos Aires, que tem a maior concentração populacional do país, entre maio de 1998 e maio de 1999, cerca de mil pessoas foram levadas à condição de pobres por dia, segundo pesquisa feita pelo jornal La Nación, em 17 de outubro de 1999. Segundo essa pesquisa, 250 mil pessoas tornaram-se indigentes, passando a ganhar menos de US$ 210,00 por mês. Em 1994, os pobres argentinos chegaram a 9,3 milhões de pessoas. Após os dois mandatos de Menem, esse número chegou a 13,4 milhões de pessoas. Neste mesmo período, o desemprego atingiu cerca de 30% da população economicamente ativa.

Recomendadas e aplaudidas por instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, as política privatizantes de Menem quebraram a Argentina, arrastando milhões de pessoas para a pobreza e o desemprego, e arrebentaram com a estrutura produtiva do país. O país ainda paga as contas desse modelo muito aplaudido há alguns anos e implementado, com diferentes modulações, em praticamente toda a América Latina.

2 comentários:

Anônimo disse...

Obrigado por este destacamento, foi bastante útil e disse um monte

redbaron disse...

Amigo, repeti a matéria na nossa nova página, dê uma olhada.
Abs. AIRTON MELO..

http://infraton.blogdevoo.com/2011/05/privatizacao-das-aerolineas-argentinas-e-exemplo-de-saque-ao-patrimonio-publico/